Crédito: Gilberto Perin

Por Ney Anderson

Em homenagem aos 10 anos do Angústia Criadora, escritores de todo o país falaram com exclusividade ao site sobre literatura, processo criativo, a importância da escrita ficcional para o mundo e para a vida e diversos outros assuntos. Leia a entrevista a seguir com o convidado de hoje. Divulgue nas suas redes sociais. Acompanhe o Angústia Criadora também no Instagram: @angustiacriadora e Facebook: https://facebook.com/AngustiaCriadora

 

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Morgana Kretzmann é escritora, autora do elogiado romance, Ao pó, seu livro de estreia. Roteirista, atualmente trabalha em um  novo projeto de série para uma plataforma de streaming. Editora da RevistaRia, a revista literária da Ria Livraria, que logo, torçamos, estará com suas portas reabertas. Atriz, atuou em diversos filmes, séries e peças de teatro, entre eles o curta-metragem, premiado nacional e internacionalmente, “A Pedra”, que abriu o Festival de Gramado de 2018 junto com longa-metragem Bacurau. Trabalha atualmente na produção de dois novos romances  policiais que se passam no interior profundo de um Brasil extremo ainda desconhecido.

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O que é literatura?

É o que me salvou de ter uma vida medíocre. É o que salvou, e ainda salva, pessoas nessa pandemia.

O que é escrever ficção?

É trabalho, é pagar as contas, mas também é prazer. Diversão, prazer de entrar num universo paralelo, totalmente diferente do seu para contar uma história.

 Escrever é um ato político? Por qual motivo?

Escrever é um ato de amor e de fé. Quem sabe um seja sinônimo do outro. Nós que somos contadores de histórias, precisamos ter fé nas nossas verdades inventadas e acreditar que dias melhores virão. O amor também é sobre isso.

Para além do aspecto do ofício, a literatura, de forma geral, representa o quê para você?

Representatividade, liberdade e coragem.

O escritor é aquela pessoa que vê o mundo por ângulos diferentes. Mesmo criando, por vezes, com base no real, é outra coisa que surge na escrita ficcional. A ficção, então, pode ser entendida com uma extensão da realidade? Um mundo paralelo?

Ultimamente tenho dito muito a frase, “está difícil competir com a realidade”. A realidade tem sido muito mais cruel. Olhar para tudo que estamos vivendo, principalmente no Brasil, tem sido um exercício diário e difícil, mesmo para alguém que trabalhe com ficção.

Quando você está prestes a começar uma nova história, quais os sentimentos e sensações que te invadem?

Da euforia à insegurança num mesmo dia. Todo início de processo é difícil. Não importa se estou começando um novo projeto de série para televisão ou se estou começando um novo livro, eu posso até saber a história que quero contar, mas até achar a linguagem, a voz das personagens, o trabalho é árduo. Depois vem o prazer e a alegria de ter escolhido essa profissão.

A leitura de outros autores é algo que influencia bastante o início da carreira do escritor. No seu caso, a influência partiu dos livros ou de algo externo, de situações cotidianas, que te despertaram o interesse para a escrita?

Os livros, com certeza.

Você escreve para tentar entender melhor o que conhece ou é justamente o contrário? A sua busca é pelo desconhecido?

Não poderia, nem conseguiria escrever sobre algo que não tivesse conhecimento.

O que mais te empolga no momento da escrita? A criação de personagens, diálogos, cenas, cenários, narradores….etc?

Os diálogos são as coisas que mais gosto de escrever.

Um personagem bem construído é capaz de segurar um texto ruim?

Difícil. Texto é ruim não prende leitor. Ele vai abandonar a leitura antes de perceber que a personagem pode ser  boa.

Entre tantas coisas importantes e necessárias em um texto literário, na sua produção, o que não pode deixar de existir?

Ainda não tenho muita certeza sobre essa resposta, mas hoje, em abril de 2021, poderia dizer que é o humor em pequenas doses.

Nesse tempo de pandemia, de tantas mortes, qual o significado que a escrita literária tem?

Como eu disse, escrever me salvou e continua me salvando, principalmente nessa pandemia. Criei uma disciplina de trabalho escrevendo todos os dias pelo menos oito horas por dia.

No Brasil, o ofício do escritor é tido quase com um passatempo por outras pessoas. Será que um dia essa realidade vai mudar? Existem respostas lógicas para esse questionamento eterno?

Todas as profissões ligadas à arte não são vistas como trabalho por uma porção de brasileiros. É uma herança horrível que ganhamos do tempo do Brasil Colônia. Eu, sinceramente, não ligo e não dou nenhuma importância para essas pessoas ou esses comentários.

A imaginação, o impulso, a invenção, a inquietação, a técnica. Como domar tudo isso?

Se tentar domar perde a graça e também o sentido de escrever.

O inconsciente, o acaso, a dúvida…o que mais faz parte da rotina do criador?

Acredito que seja tudo isso e mais um bocado de coisas. O imprevisível também é fundamental para quem está tentando contar uma história.

O que difere um texto sofisticado de um texto medíocre?

A opinião de cada leitor.

O leitor torna-se cúmplice do escritor em qual momento?

Quando ele passa a acreditar naquela história que ele está lendo.

O simples e o sofisticado podem (e devem) caminhar juntos?

Com certeza. Se você pegar os livros do Paulo Scott, por exemplo, verá isso a todo momento, frases, parágrafos, capítulos inteiros que o sofisticado e o simples estão ali presentes te levando pela narrativa.

Cite um trecho de alguma obra que te marcou profundamente.

Vou primeiro citar um trecho de um livro que me marcou recentemente:

‘“Sempre que o marido citava a palavra “judeu” dentro de casa, ela tinha um ataque de nervos.”Vira a boca pra lá. Não vê que estão caçando esse povo? Alemão, Eduardinho! Você é descendente de alemão.”’

(Jazz Band – na sala de gente – do Alexandre Staut)

 Aqui um trecho de um livro que me marcou desde que li:

“Recorrer à proteção do silêncio quando a verdade está para aflorar foi como uma lei de nossa vida.”

(Delírio – de Laura Restrepo)

 Apenas um livro para livrá-lo do fim do mundo em uma espaçonave. O seu livro inesquecível. Qual seria?

São dois:

Enquanto Agonizo do William Faulkner e Os Malaquias da Andréa Del Fuego.

Qual a sua angústia criadora?

Minha angústia criadora muda de projeto para projeto.  Nesse momento tem sido com a linguagem do que estou escrevendo, tanto para a série, como para o novo romance.

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