Por Ney Anderson
Em homenagem aos 10 anos do Angústia Criadora, escritores de todo o país falaram com exclusividade ao site sobre literatura, processo criativo, a importância da escrita ficcional para o mundo e para a vida e diversos outros assuntos. Leia a entrevista a seguir com o convidado de hoje. Divulgue nas suas redes sociais. Acompanhe o Angústia Criadora também no Instagram: @angustiacriadora e Facebook: https://facebook.com/AngustiaCriadora
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Nara Vidal é escritora, professora, editora e tradutora. Escreve regularmente para o Jornal Rascunho e a Tribuna de Minas. Tem livros infantis e adultos. Seu romance de estreia Sorte foi um dos vencedores do Prêmio Oceanos e teve direitos vendidos para a Holanda e México. Seu mais recente livro, Mapas para Desaparecer, é uma seleção de contos. Mora na Inglaterra.
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O que é literatura?
É nunca estar sozinha.
O que é escrever ficção?
É poder mentir compulsivamente sem culpa e é nunca estar sozinha.
Vocação, talento, carma, destino…..o escritor é um predestinado a carregar adjetivos que tentam justificar o ofício?
Na maioria das vezes escrever tem relação direta com privilégio, infelizmente. Muitas mulheres, por exemplo, demoraram a se colocar como escritoras porque não tinham tempo para criar. Mas sobre isso, Virginia Woolf fala muito bem em Um teto todo seu.
Qual o melhor aliado do escritor?
A leitura e as artes, em geral.
E qual o maior inimigo?
A pressa e a vaidade.
Escrever é um ato político? Por qual motivo?
A ficção, na minha opinião, não deve ter compromisso com absolutamente nada, mas pode instigar e até inspirar discussões de cunho político. Já escrever não-ficção, ensaios e matérias pode sim, ser um ato político mais declarado e mais facilmente identificado.
Quais os aspectos que você leva em conta no momento que começa a escrever?
Penso e duvido sempre se a forma com a qual eu vou contar uma história vai ser boa. Todas as histórias são boas, mas a maneira de contar cada uma é que diferencia bons livros dos ruins e medianos.
A literatura existe para entendermos o começo, o meio ou fim?
A literatura existe para não entendermos. A literatura pode nos trazer consolo quanto a nossa própria confusão.
Se escreve para buscar respostas ou para estimular as dúvidas?
Os dois. Depende do que se escreve.
Criar é tatear no escuro das incertezas?
Nem sempre. Há quem escreva cheio de certezas ou cheio de incertezas.
Cite um trecho de alguma obra que te marcou profundamente.
Não é possível. A gente escolhe uma e amanhã se arrepende de não ter citado outra. Não sou boa nesses exercícios de exclusão.
É possível recriar o silêncio com as palavras? Como?
Sim, através do pacto de leitura entre escritor e leitor, quando for honesto o silêncio. É possível, sim.
Você acredita que qualquer pessoa pode escrever uma história? Mas, então, o que vai fazer dela escritora, de fato?
Acho que qualquer um pode contar uma história. Há quem conte bem e há quem não consegue segurar a atenção do ouvinte. A mesma coisa acontece com a história escrita. Escrever qualquer um pode. Excelentes livros ainda são a exceção.
É preciso saber olhar o mundo com os olhos da ficção? O mundo fica melhor ou pior a partir dessa observação?
Depende do dia, certo? Eu não acredito que o escritor seja essa sensibilidade ambulante. Às vezes você olha uma mesa e ela é exatamente isso: uma mesa. Não há lirismo ou melodia nisso. Não sei se o mundo fica melhor ou pior a partir da observação com olhos de ficção. Talvez quem leia muito seja mais crítico e aí o mundo pode até se tornar mais pesado. Mas não encontrei ainda alguém que quisesse trocar a bagagem de leituras pela inexperiência de ler.
Todo texto ficcional, mesmo os mais extensos, acaba sendo apenas um trecho ou fragmento da história geral? Digo, a ficção lança o seu olhar para as esquinas das situações, sendo praticamente impossível se ter uma noção do todo?
Não acredito que seja o caso. Há muita liberdade na criação. Existe história que se limita a um recorte. Há outras que são histórias completas porque foram contadas assim. Nada é absoluto na criação literária
Nesse sentido, uma história nunca tem início, meio e fim?
Há histórias com um fim bastante marcado. Há outras que pairam e levamos conosco. Essas permanecem.
Você escolhe os seus temas ou é escolhido por eles?
Eu os escolho.
É necessário buscar formas de expressão cada vez menos sujeitas ao cânone, desafiando a língua, tornando-a mais “suja”, para se aproximar cada vez mais da verossimilhança que a história pede? Ou seja, escrever cada vez “pior”, longe da superficialidade de escrever “certinho”, como disse Cortázar, talvez na tentativa de fugir da armadilha do estilo único?
Depende do projeto. A liberdade é inegociável e o autor pode tentar o que desejar: limpar ou sujar o seu texto.
Quando é que um escritor atinge a maturidade?
Quando morre.
O leitor torna-se cúmplice do escritor em qual momento?
Eu acredito que uma leitura só acontece de forma profunda se há um pacto entre quem narra e quem ouve. O leitor precisa ter a generosidade de ouvir com atenção o que o escritor narra com tanto cuidado. Se esse pacto não se pré-estabelece é uma perda de tempo.
Apenas um livro para livrá-lo do fim do mundo em uma espaçonave. O seu livro inesquecível. Qual seria?
Eu morreria porque não sei escolher, nem mesmo assim, sob pressão.
Qual a sua angústia criadora?
Não tenho ideia.