Por Ney Anderson

“Entre as pernas abertas do gordo semiconsciente, Jefferson se ajoelha e abre a braguilha… engole amargo o que restou do sêmen na garganta… talvez já tivesse visto aquele gordo mesmo. Talvez aquele rosto fosse familiar…”. 


Essa é uma parte do conto homônimo do livro Pornofantasma (Editora Record, 320 pgs. R$ 44,90), primeiro livro de contos do escritor Santiago Nazarian. O autor estreou na literatura em 2003 com Olívio (Prêmio Fundação Conrado Wessel de Literatura), lançou outros quatro romances e agora publica o primeiro livro de contos, que exibe uma sexualidade reprimida entre sangue, terror e apocalipse. Sempre provocante Nazarian, 33 anos, já inova na capa: uma cobra aparentemente morta com a boca aberta (elaborado por ele e Alexandre Matos). Nada é o que parece ser à primeira vista. A cobra apenas se finge de morta para enganar os predadores. Boa parte dos textos já foram publicados em antologias.



Alguns autores recentes caem na armadilha da “crítica” que desdenham as novas gerações de ficcionistas, afirmando que eles só escrevem as mesmas coisas, não renovam seu fôlego e nunca trazem coisas novas para os leitores. De fato muitos escritores sofrem o “mal da geração”; não passam sinceridade nos textos e não conseguem dar o “pulo do gato”, atingir o outro lado do muro, apenas por acreditarem no conceito que tal geração (no qual estão inseridos) escreve sobre tal assunto. Santiago Nazarian conseguiu passar incólume por essas armadilhas e sempre escreveu sobre o que pensava escrever. “Pornofantasma” é um Nazarian em pedaços, que não tem medo de exibir seus fantasmas.


Catorze histórias compõem o livro. Contos que carregam um clima de suspense e terror em cada linha percorrida. Em “Catorze anos de fome”, moradores de um prédio falam(e mentem) sobre um homem que nunca mais saiu de um dos apartamentos; “Todas as cabeças no chão,menos a minha”, é uma bela fábula inspirada nos “Irmãos Grimm”, conta a história de um príncipe que vai à procura da mulher amada, com uma espada na mão e algumas palavras mágicas, mata todos que entram em seu caminho.


O terror aparece em maior profundidade no conto “Marshmallow Queimado”: alguns amigos contam histórias de terror misturado com sexo, o local escolhido para isto? Um cemitério.


O conto que dá título à obra é o melhor texto deste livro: Jefferson, um pai que perde o filho vítima de overdose, encontra anos depois na internet vídeos pornôs com um ator que é a cara do filho, começa então uma busca desenfreada para tentar “resgatar” o rapaz que ele julga em apuros; Jefferson vai parar em uma cidade fantasma onde acha que os vídeos podem ter sido feitos e desconfia que boa parte dos habitantes possam ser atores pornôs. A procura pelo rapaz cria momentos de puro suspense. Não sabemos (ou não precisamos saber), se o ator que Jefferson procura realmente existe, se o filho realmente morreu, ou se tudo não passa de esquizofrenia. “Jefferson então repara melhor no balconista caipira. O caipira ainda sorri. Parece familiar aquele sorriso. Parece com quem? Com uma vida passada, até parece com seu filho. Com seu filho? Jefferson tenta encaixar aquele sorriso em outra vida, outros gemidos”. Esse conto define a proposta do livro.


Os textos mostram um autor amadurecido, que não esconde suas influências e obsessões. Talvez a maior obsessão do escritor seja pela forma, que mostra-se em grande evolução.

 

Santiago Nazarian é um autor para ser lido com calma, tomando um bom vinho, para entender suas referências e a busca por uma escrita onde o que se diz não possa ser visto à olho nu, mas nas entrelinhas, onde se desenrola a verdadeira ficção.

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