Fotos: divulgação

Por Ney Anderson

 

O Brasil está longe de ser um país de leitores. Isso se for levado em consideração uma pesquisa realizada em 2013 pelo Instituto Pró-Livro, em parceria com o Ibope Inteligência. De acordo com os dados divulgados, foram considerados leitores aqueles que disseram ter lido uma obra em três meses. Os números mostram que houve uma queda de 95,6 milhões (55% da população estimada), em 2007, para 88,2 milhões (50%), em 2011. A diminuição da leitura foi medida também entre crianças e adolescentes com idades entre 5 e 10 anos. Eles leram 5,4 livros, ante 6,9 registrados no levantamento de 2007. O mesmo ocorreu entre os pré-adolescentes de 11 a 13 anos (6,9 ante 8,5) e entre adolescente de 14 a 17 (5,9 ante 6,6 livros).

Mas, contrariando as pesquisas, foi justamente nessa faixa etária que a escritora Thalita Rebouças, que é jornalista de formação, conseguiu fixar seu nome. Com quatorze livros publicados e mais um prestes a ser lançado, em parceria com o quadrinista Maurício de Sousa, ela não apenas conseguiu realizar o sonho de viver de literatura, como já passou da incrível marca de um milhão de livros vendidos.

Essa história começou em 2001, quando ela resolveu abandonar o jornalismo para se dedicar integralmente à literatura. Traição entre Amigas foi o primeiro livro publicado. Mas só dois anos depois que Thalita começou a ter o trabalho reconhecido com o sucesso de Tudo por um Pop Star. Depois dele veio a série Fala Sério, que conta de maneira bem humorada a relação dos jovens com a mãe, pai, professor, amiga, namorados e os filhos. Thalita já tem parte da obra publicada em Portugal. Em 2014  terá  os livros lançados em toda a América Latina.

Em entrevista exclusiva ao Angústia Criadora, Thalita Rebouças falou de vários assuntos, entre eles a busca por leitores no começo da carreira e o peso de ser uma autora com mais de um milhão de livros vendidos.

 

“Eu quero viver de literatura e para isso preciso vender”

Você virou uma referência nacional na literatura para jovens. Se aproximar de um público desses sempre foi sua ideia principal?

Na verdade foi esse público que me escolheu, pois Traição entre Amigas, meu primeiro livro, era voltado para um público mais velho, de 18 a 25 anos. Quando eu percebi que os adolescentes gostavam da minha forma de escrever decidi direcionar meus livros para eles.

Escrever para leitores específicos é mais difícil do quê produzir para adultos?

Para mim, escrever para os adolescentes é fácil. É natural, eu não preciso fazer esforço. Quando estou criando, uma menina de 14 anos que ainda esta aqui dentro toma a frente e escreve. Quando estou revisando, a Thalita adulta assume e coloca ordem na casa. Mas escrevo sem sofrimento.

Antes de se assumir escritora em tempo integral, você trabalhava no jornalismo diário. Qual lição tirou da época de repórter?

Inspiração existe, mas é um luxo. É preciso escrever todos os dias para se manter em forma. E nada como um diretor de redação gritando quanto tempo falta para o fechamento para ensinar essa lição.

As dificuldades dos autores iniciantes são muitas, entre elas, publicar o primeiro livro. Você resolveu investir na sua carreira como autora deixando de lado o jornalismo. Existia um “Plano B”, caso não desse certo?

Não, para desespero da minha família. Mas eu tinha 25 anos e achava que era a hora de arriscar. Fui inconsequente, claro, e demorei seis anos para ganhar algo parecido com um bom salário. Nesse período o meu marido me ajudava, mas a gente vivia apertado, sem luxo nenhum.

A busca por leitores talvez seja mais difícil ainda depois que o livro está pronto.  Você utilizou alguns artifícios bem diferentes para consegui-los, como subir em cadeiras nas Bienais para chamar atenção das pessoas. O reconhecimento pelo seu trabalho veio com o tempo. Mas o que realmente queria, ou quer, com seus livros?

Primeiro, viver de literatura. Adoro escrever e poder fazer disso a minha única profissão é sensacional. Com os livros, quero que os adolescentes se divirtam, pensem e tirem as suas próprias conclusões. Não quero impor o que é certo ou errado. E, mais importante ainda, quero que eles virem adultos leitores.

Você já disse que sua vontade em escrever nasceu quando ainda era criança. De alguma forma, essa primeira expressão de artista, foi determinante para fazer de você uma autora infanto-juvenil? 

Não, eu não pensava em escrever para eles até que vi como eles gostaram do meu primeiro livro.

É muito comum dizer que os jovens de hoje não gostam de ler, por conta dos jogos eletrônicos, internet etc. No entanto, livros como os da série Harry Potter, Senhor dos Anéis, Crepúsculo, venderam milhões. Esse tipo de literatura é o caminho para formar um país de leitores?

Claro! É melhor ler até bula de remédio do que não ler. Discordo, por exemplo, que a Internet seja inimiga da leitura. Acho que os adolescentes estão lendo cada vez mais e que a Internet ajuda muito nisso, já que eles precisam ler e escrever para se comunicar. Isso sem falar nas redes como o Skoob, que aproxima os leitores.

Os e-books podem ser uma alternativa? O que acha deles?

Acho que ainda demora para que façam diferença num país como o Brasil. As classes C, D e E precisam comprar muitas outras coisas antes de comprar um e-reader. Mas é claro que é uma ideia muito atraente, eu só viajo com o meu, apesar de ainda comprar muitos livros de papel.

Seu 15º livro foi feito em parceria com Maurício de Sousa, um ícone dos quadrinhos para crianças. Como foi trabalhar com ele?

Sensacional, não acreditei quando ele mesmo me convidou para fazermos um livro juntos. Estou ansiosíssima para autografar ao lado dele, é um dos meus ídolos.

Alguns livros seus serão lançados em outros países. Os temas nas suas obras são universais?

O cotidiano dos adolescentes é muito parecido em vários países. Já alguns livros meus terão pouco espaço no mercado internacional, por serem, vamos dizer, avançados demais. Uma menina que tem tantos namorados, como a Malu da série Fala Sério não é bem vista em países muito conservadores.

Qual o peso em ser uma autora que já vendeu mais de 1 milhão de livros?

O próximo livro é sempre um problema, será que ele vai vender tanto quanto os outros? Mas, no geral, não sinto um peso tão grande, pois lutei muito para chegar lá. A rotina de divulgação é dura, aeroporto-evento-hotel-aeroporto, mas esse era o meu sonho. Se algumas coisas são chatas na rotina de um escritor, outras também seriam se eu tivesse continuado como jornalista.

Além dos livros, você também tem produtos com o seu nome. É uma linha muito tênue entre a arte e o negócio. Como consegue equilibrar essas questões?

Controlo com mão de ferro os produtos que licencio. Se não têm uma mensagem bacana ou uma qualidade boa, não faço. Já produtos da linha escolar (mochila, caderno, estojo etc) eu adoro, pois acho mais bacana os alunos comprarem esses produtos com frases ou o nome de uma escritora do que comprarem os mesmo produtos anunciados pela banda descartável da vez.

Escrever uma literatura “adulta” está longe dos seus objetivos? Por quê?

Por enquanto sim, gosto de escrever para adolescentes, adoro a forma carinhosa com que eles me tratam. As crônicas do meu blog têm me bastado para suprir a vontade de escrever para outro público.

No Brasil a tiragem padrão de um livro é de 5 mil exemplares. Essa marca é uma piada comparada com a tiragem dos seus livros. Você percebe algum preconceito dos escritores de uma literatura dita “séria” pelos Best-Sellers?

Isso é muito comum, não só no Brasil. Claro que já escutei algumas indiretas nas feiras que visito, algumas perguntas capciosas, mas não me incomoda. Eu quero viver de literatura e para isso preciso vender. Se um livro dito comercial é também um livro menor, na opinião de alguém, eu aceito a opinião e sigo fazendo o que eu gosto. Eu adoraria saber escrever como Saramago, um gênio, mas não é a minha praia.

Muitas respostas inusitadas já foram dadas por escritores sobre como produziram suas obras. O poeta Pablo Neruda soltou essa: “Escrever é fácil. Você começa com uma letra maiúscula e termina com um ponto final. No meio você coloca as ideias”. Qual a resposta inusitada sobre o seu processo criativo?

Quando alguém quer me incomodar e diz que escrever livros como os meus é fácil, eu sempre digo:É muito fácil! Abra o Word, clique em arquivo, depois em novo, e encha a tela em branco que aparece com um monte de palavras. Só isso.

4 thoughts on “Thalita Rebouças, o fenômeno da literatura juvenil”
  1. Gosto muito da Thalita Rebolças… Adoorei a entrevista. É sempre muito bom saber coisas novas de pessoas como ela.
    O Angústia Criadora está de parabéns.

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