Por Ney Anderson

Álvaro, Sílvio, Ribeiro, Neto e Ciro são amigos desde a década de sessenta, se conheceram na praia e fizeram tudo o que era possível fazer em termos de vadiagem. Cada um deles tem a vida recontada de forma particular e sob diversos pontos de vista no livro Fim, estreia da atriz Fernanda Torres na literatura. É a visão das mulheres, filhos e amigos, que acaba desenhando os cinco personagens por todos os ângulos. O livro é, acima de tudo, sobre a vida e não sobre o fim (como o título sugere), desses amigos.Esse romance tem de tudo um pouco: ironia, drama, melancolia, humor etc. Mas nada é explorado ao extremo, talvez por causa da própria ideia em mostrar os cinco amigos por outros olhares, onde uma mesma pessoa é percebida de forma diferente a partir das visões particulares de cada um. Os personagens centrais da obra também têm “voz”, o que faz um contraponto interessante com a opinião alheia. O romance é bem escrito, tem uma boa premissa, mas peca por não deixar o leitor fazer suas próprias considerações sobre as histórias contadas. Isso acontece porque tudo é entregue de bandeja, sem espaço para dúvidas. No entanto, os personagens são tão bem desenhados que a identificação com eles não é difícil.

Essa boa construção sem dúvida é fruto da experiência de Fernanda Torres nos palcos e na TV. No palco ou na frente das câmaras a luta do ator é ser convincente para prender o público até o final do espetáculo. Já na literatura, o objetivo é prender o leitor até a última página. Nesse caso, a função do livro é alcançada quando a história é convincente é consegue prender o leitor. Os fatos que acontecem no romance não precisam estar presos ao mundo real. Essa “realidade ficcional” é o maior mérito de qualquer obra literária, sem ela o livro corre o risco de ser apenas mais um emaranho de páginas. Uma das coisas que ajudam nesse aspecto é ambientação da história. Coisa que autores como Jorge Amado, Érico Veríssimo, Dalton Trevisan e Ariano Suassuna, por exemplo, sempre executaram tão bem, mostrando a Bahia, Curitiba, Rio Grande do Sul e o sertão do Nordeste, respectivamente, de maneira particular e enriquecedora.

Fernanda Torres conseguiu fazer isso de forma igualmente interessante com o Rio de Janeiro (cidade onde se passa toda a trama e tem papel fundamental na narrativa), dentro das próprias limitações de escritora iniciante. Se observado com mais atenção, a cidade exerce um papel de protagonista, não apenas de cenário. A impressão que ficou após a leitura foi de uma autora que não entrou nesse mundo por acaso, e que ainda vai contribuir muito para a chamada literatura contemporânea. Fim foi um bom começo (com o perdão do trocadilho) na ficção de uma mulher que já está acostumada com os holofotes, mas que busca agora o aplauso silencioso que somente a literatura é capaz de provocar.

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