Foto – Nuno Papp-Divulgação

Por Ney Anderson

Em homenagem aos 10 anos do Angústia Criadora, escritores de todo o país falaram com exclusividade ao site sobre literatura, processo criativo, a importância da escrita ficcional para o mundo e para a vida e diversos outros assuntos. Leia a entrevista a seguir com o convidado de hoje. Divulgue nas suas redes sociais. Acompanhe o Angústia Criadora também no Instagram: @angustiacriadora e Facebook: https://facebook.com/AngustiaCriadora

 

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Giovana Madalosso nasceu em Curitiba, em 1975, e vive em São Paulo. É formada em Jornalismo pela UFPR. Escreveu o volume de contos A teta racional, finalista do Prêmio Biblioteca Nacional, e o romance Tudo pode ser roubado (Todavia, 2018), finalista do Prêmio São Paulo de Literatura. Em 2020, lançou Suíte Tóquio pela Todavia, que teve os direitos adquiridos pela Conspiração Filmes.

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O que é literatura?

Meu lar. Ou, ao menos, um deles.

O que é escrever ficção?

Existir em outro plano.

Escrever é um ato político? Por qual motivo?

Qualquer ato é político.

Para além do aspecto do ofício, a literatura, de forma geral, representa o quê para você?

Identidade. Descubro quem fui pelo que estava lendo em determinada época. Descubro quem serei pelo que estou lendo agora. Ao longo dos anos fui me construindo e transformando amparada pela literatura. Não saberia viver sem ela.

Foto: Renato Parada

O escritor é aquela pessoa que vê o mundo por ângulos diferentes. Mesmo criando, por vezes, com base no real, é outra coisa que surge na escrita ficcional. A ficção, então, pode ser entendida com uma extensão da realidade? Um mundo paralelo?

A literatura abarca todos os mundos que não esse. São incontáveis os mundos que existem além daqui.

Quando você está prestes a começar uma nova história, quais os sentimentos e sensações que te invadem?

Quando estou começando um romance, sinto como se estivesse numa montanha-russa no exato momento em que o carrinho para no topo, prestes a despencar. Acho que vai ser bom, acho que vai ser difícil, tenho certeza que vai ser emocionante. É a adrenalina de deixar que ideias e sentimentos voem soltos, te descabelem, te revirem, até você retomar o controle para dar forma ao que se tornará a matéria do romance.

A leitura de outros autores é algo que influencia bastante o início da carreira do escritor. No seu caso, a influência partiu dos livros ou de algo externo, de situações cotidianas, que te despertaram o interesse para a escrita?

Eu leio muito desde que me alfabetizei. Foi a paixão pela leitura que me levou a escrever.

Você escreve para tentar entender melhor o que conhece ou é justamente o contrário? A sua busca é pelo desconhecido?

Tudo é desconhecido. Você pode se iludir de que conhece alguma coisa mas basta se debruçar sobre o objeto de interesse para ver que sempre há muito o que ser descoberto. Eu escrevo para tentar entender a vida, mesmo sabendo que nunca irei entendê-la.

O que mais te empolga no momento da escrita? A criação de personagens, diálogos, cenas, cenários, narradores….etc?

O que mais me empolga é a criação de narradores. Mais especificamente: de uma voz única para cada narrador.

 Um personagem bem construído é capaz de segurar um texto ruim?

Nada é capaz de segurar um texto ruim. Por outro lado, um bom narrador (e isso pressupõe um bom texto) é capaz de segurar qualquer coisa.

 Entre tantas coisas importantes e necessárias em um texto literário, na sua produção, o que não pode deixar de existir?

Beleza.

Nesse tempo de pandemia, de tantas mortes, qual o significado que a escrita literária tem?

Alívio para o escritor, reflexão para os leitores, construção de memória para o coletivo.

A imaginação, o impulso, a invenção, a inquietação, a técnica. Como domar tudo isso?

Praticando. Tem uma imagem que sempre vem à minha cabeça quando penso na produção literária: um animal selvagem preso por uma coleira. Para mim escrever é isso: dominar com o pulso a selvageria. E para isso é preciso músculo, treino.

 O inconsciente, o acaso, a dúvida…o que mais faz parte da rotina do criador?

Sucumbir ao incômodo. Ao menos no meu caso, é sempre de algum incômodo que nasce a escrita.

O que difere um texto sofisticado de um texto medíocre?

A quantidade de camadas.

 O leitor torna-se cúmplice do escritor em qual momento?

Quando aceita a realidade proposta pelo livro.

O leitor ideal existe?

Cada leitor é ideal a sua maneira.

O simples e o sofisticado podem (e devem) caminhar juntos?

Não vejo razão para essa regra.

Cite um trecho de alguma obra que te marcou profundamente.

“O amor nunca é melhor do que o amante. Quem é mau, ama com maldade, o violento ama com violência, o fraco ama com fraqueza, gente estúpida ama com estupidez, e o amor de um homem livre nunca é seguro. Não há dádiva para o ser amado. Só o amante possui a dá vida do amor”, Toni Morrison, em O olho mais azul.

Apenas um livro para livrá-lo do fim do mundo em uma espaçonave. O seu livro inesquecível. Qual seria?

Detetives Selvagens, do Roberto Bolaño.

 Qual a sua angústia criadora?

A minha transmutável angústia de todos os dias.

One thought on “Giovana Madalosso: “descubro quem fui pelo que estava lendo em determinada época. Descubro quem serei pelo que estou lendo agora””
  1. Acompanho , sempre que posso, entrevistas com escritora(os).
    A página é ótima. Gostei muito das entrevistas das mulheres. A Giovanna madalosso mandou bem. ” O olho mais azul” da Toni Morrisson. Um excelente livro. Uma escritora negra na Angústia criadora. É poder.

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